sexta-feira, 5 de setembro de 2008

mais um sobre dias em branco

esse texto o ikeda escreveu pro blog dele.

O Branco em Filme

Dias em Branco
de Irmãos Pretti
DVD,

Há um filme do Arthur Omar chamado Congo, que ele próprio denominou como “um filme em branco”. Em branco, pois o que podemos saber sobre os congos, o que um documentário pode nos fornecer de informação sobre uma manifestação cultural de nós tão distante, quase perdida?

“Dias em Branco” parte mais ou menos da mesma premissa: é um filme em branco. Mas há uma pequena diferença, sutil, mas que faz toda a diferença: um dia “em branco” é muito diferente de um “não-dia”. O “em branco” é sinal de construção. “Não sei o que fazer. Fico o dia todo olhando para a parede branca de meu quarto. Eu poderia filmar essa parede, já que a conheço bem.”. Ou seja, i) a parede em branco significa que existe uma parede; ii) a parede não é motivo simplesmente de paralisia, mas motiva a ação de filmar essa parede.

A partir desse dado simples, os irmãos pretti desenvolveram um trabalho em continuidade com todos os seus temas (a solidão, o rigor da estrutura, os tempos mortos, a duração) mas absolutamente transformador. Através de uma narrativa paralela mas que não necessariamente se cruza, Dias em Branco é um retrato íntimo de um deslocamento mas sem esbarrar na psicologia ou nas motivações de personagens. Acima de tudo, as pessoas são (isto é, antes de ser branca, a parede existe). Por isso, por trás de um cinema de inércia, da imobilidade e do desconsolo, existe um desejo que pulsa abaixo da superfície, um cinema que busca um caminho de construção por trás do cansaço. Existe uma comunhão implícita entre os personagens, mesmo que eles não se encontrem. Uma proposta de cinema moderna, que tangencia os instigantes trabalhos de problematização da dramaturgia como os de Claire Denis e os filmes de reavaliação das potencialidades do cinema (e das pessoas) poder em expressar seus sentimentos, como os filmes orientais. Na liberdade da câmera, na sutileza dos contornos narrativos, pela liberdade da dramaturgia, pela força de estrutura, não seria exagero dizer que se Dias em Branco não é o melhor filme dos meninos (o que talvez até seja), é o que mais aponta para novas perspectivas e potenciais na filmografia dos diretores.

Marcelo Ikeda

2 comentários:

leonardo marona disse...

Meu irmão Luiz Pretti,

Com relação ao poema “desconstrução do amor”, ele não é mesmo bizarro, o amor? Quanto mais a gente sente mais amplo ele fica e, com isso, mais rotulantes se tornam os nomes que damos às diversas faces do amor. É mesmo um negócio complicado e super-cabeça. E o amor acaba sendo no fim muito cabeça, grande parte do tempo. Mais tem certas vezes que se roçam os pés sob as colchas, tem dias que simplesmente se olha sob um determinado ângulo determinado rosto que reflete muitas dúvidas e, não que as dúvidas desapareçam, não é isso, apenas descobrimos que quanto mais pudermos mantê-las, talvez proliferadas, mas viveremos a essência criativa do amor, que acima de tudo caminho sem parada, e tudo que pequenas partículas inomináveis de coisas desconhecidas podem nos causar de cataclismo, dor e parto, que são essência do indivíduo e morte da mentira do amor como arma de afastamento da vida descontrolada, que jorra como fluxo natural. Mas ainda assim, querido, o poema era apenas uma exaltação ao desconhecido, porque amor desconstruído vem só da sabedoria e, como vê, estou aqui me enrolando, muito longe portanto de um sábio.

E, falando em sábio, o outro poema, o “samurai”, eu escrevi meio que automaticamente, quase algo mediúnico e super-transcendental, depois que eu vi o Forest Whitaker lendo o Hagakure naquele filme extraordinário do Jim Jarmusch, digamos, o filme mais pop dele até o Flores Partidas: Ghost Dog. Eu adorei esse filme e fiquei me imaginando sob a ética samurai e comecei a pensar portanto em lâminas e resolvi terminar de uma vez com essa história escrevendo de uma vez sobre isso e coisa e tal te amo e desculpe se me alonguei demais beijo te cuida. leo marona.

Anônimo disse...

leo,

se alongue sempre! hoje de manhã eu acordei pensando no quanto que eu sinto falta de me encontrar com amigos só pra "filosofar". conversar sobre a vida de maneira teórica sem ter que sempre apelar para a nossa vida prática. parece que com o passar dos anos o que escolhemos fazer da nossa vida acaba engolindo a gente e só sabemos pensar a partir desse ponto de vista. confesso que isso pode ser muito cansativo.
já o amor, eu acho que falastes muito bem no teu comentário. eternamente misterioso, incontrolável, imprevisível. ainda assim, maravilhoso. sempre queremos mais com tudo que ele tem de bom e de ruim...

se tu gostas do filme do jarmusch (eu também gosto) não deixe de ver o do jean pierre melville "O Samurai".

beijos. te cuida também aí por esse rio de janeiro.

com amor.